
Há uma semana, o Brasil encerrava quase 72 horas de tensão e incertezas no Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo. Após ser detido no último sábado
e levado à superintendência da Polícia Federal em Curitiba, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou sua pena de 12 anos e 1
mês por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex no Guarujá.
Segundo a acusação, o petista teria recebido propinas da construtora
OAS no valor de 2,2 milhões de reais para reformar o apartamento no
litoral paulista. A defesa alega que Lula não é o dono do apartamento.
Este é um dos sete processos em que o petista é réu.
Desde que ingressou na sede da PF
da capital paranaense, o petista ouve todas as manhãs um sonoro "bom
dia presidente" de seus apoiadores, que estão acampados do lado de fora
há uma semana também. Enquanto isso, a presidenta do PT, senadora Gleisi
Hoffmann, e os demais dirigentes do partido não titubeiam no discurso de que Lula é o pré-candidato à presidência pelo Partido dos Trabalhadores, "sob qualquer hipótese".
De fato, mesmo condenado e detido, o político pode ser candidato e até eleito. Funciona assim:
os partidos têm até às 19h do dia 15 de agosto para registrar as suas
candidaturas. Depois disso, outros candidatos, partidos políticos,
coligações ou o Ministério Público Eleitoral têm um prazo de até cinco
dias para pedir a impugnação da candidatura, apresentando uma petição
fundamentada e com provas. A partir daí, quem decide se Lula pode ou não
ser candidato é o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Enquanto isso não
acontecer, o PT pode continuar com a campanha normalmente. "O sistema
estipula que quem pede o registro [da candidatura] já tem o direito de
começar a campanha", explica o advogado Marlon Reis, um dos autores da
Lei da Ficha Limpa.
Supondo que o TSE decida que Lula, por se
enquadrar na Lei da Ficha Limpa que veta condenados por corrupção em
segunda instância, não possa ser candidato, sobe essa decisão cabem
recursos que podem ser arrastados por quase todo o período eleitoral. "O
TSE aceitar ou não pode levar a campanha toda", diz Reis. "Há casos das
eleições de 2016 que os registros das candidaturas ainda não foram
concluídos até hoje", diz. Neste caso, porém, por se tratar de um
candidato à presidência, o processo deve ser mais rápido. Ainda assim,
pode correr ao longo de todo o período eleitoral. "Como a campanha é de 45 dias, não é improvável que a decisão saia perto do dia da eleição", diz Reis.
Se
o processo terminar em até 20 dias antes do primeiro turno, e a
candidatura de Lula não for aceita pelo TSE, o PT ainda consegue
registrar um novo candidato em seu lugar. Mas, se a decisão do TSE
ocorrer a menos de 20 dias para o primeiro turno, Lula estará fora do
jogo e levará o PT junto. Este prazo ocorre, segundo Marlon Reis, por
causa da programação das urnas eletrônicas. "A menos de 20 dias da
eleição não daria tempo de tirar o nome de Lula dentre os candidatos",
diz ele. Neste caso, todos os votos que o petista receber seriam
automaticamente anulados.
Manter o tema em evidência
Com a
possibilidade da candidatura de Lula aberta, o PT concentra forças em
criar diariamente um fato político para que sua estrela não caia no
ostracismo. Desde que o juiz Sérgio Moro decretou a prisão do petista,
no final da tarde da quinta-feira 5, Lula já passou três dias e duas
noites dentro do Sindicato dos Metalúrgicos, uma missa em celebração ao
dia em que dona Marisa faria aniversário foi celebrada no local, o
acampamento dos seus apoiadores fora montado em Curitiba. Ali,
dirigentes tentaram fazer uma visita ao ex-presidente fora do dia de
visita - e reclamaram por não consegui-lo -, e, na última sexta-feira, o
partido entrou com um pedido na Justiça para impugnar a primeira
pesquisa eleitoral realizada após a prisão e que deve ter seus
resultados divulgados neste domingo.
O Instituto Datafolha
registrou uma pesquisa no dia da prisão, 9 de abril. Nos questionários
sobre intenção de voto para presidente há nove cenários diferentes. Em
três deles, Lula é o candidato do PT. Em outros três, é o ex-prefeito de
São Paulo, Fernando Haddad. Em dois, o ex-governador da Bahia, Jaques
Wagner. E há dois cenários em que o PT não tem nenhum candidato, algo
factível, embora os petistas não admitam. Na petição entregue na
sexta-feira, argumenta-se que "sete perguntas causam danos ao Partido
dos Trabalhadores" e a Lula, já que "ignora sua pré-candidatura e
apresenta perguntas tendenciosas com potencial para induzir
entrevistados e manipular os resultados".
Outras sondagens já foram realizadas sem Lula no cenário e sem que o PT reclamasse. A mais recente, realizada logo após a condenação do petista pelo TRF4,
no final de janeiro, foi realizada pelo próprio Datafolha e mostrava
Lula na liderança (37%) em todos os cenários onde aparecia.
Progressão da pena e outros processos
Dos
12 anos e 1 mês de detenção a que Lula fora condenado neste processo,
ele terá que cumprir ao menos um sexto deste tempo (dois anos e cinco
dias) preso. Após este tempo, poderá pleitear a chamada progressão de
regime, explica o professor de direito penal da FGV, Davi Tangerino. Ou
seja, cumprir o resto da pena em prisão domiciliar, por exemplo. "Ele
também pode pleitear o direito de trabalhar ou estudar para reduzir o
tempo de pena", explica. "A cada três dias trabalhados ou a cada 12
horas de estudo, subtrai-se um dia da pena". Mas o professor pondera:
"Lula está preso em um local que não é uma unidade prisional [a
superintendência da PF]. Ali não há programas de trabalhos para os
detentos, então estatisticamente eu acho improvável que ele consiga
trabalhar".
Além do processo do tríplex, Lula ainda é réu em outros seis processos. Dois estão nas mãos de Sérgio Moro: Em um deles, o petista responde por supostamente ter recebido propina de 12,5 milhões de reais da Odebrecht. O valor é referente a um terreno em São Paulo onde, segundo delatores, seria construída a nova sede do Instituto Lula, e um imóvel vizinho ao seu apartamento em São Bernardo do Campo. No outro processo,
o ex-presidente é acusado de receber das empreiteiras OAS, Odebrecht e
Schahin vantagens indevidas no valor de 1,1 milhão de reais por meio de
reformas em um sítio em que frequentava em Atibaia (SP).
Fora de Curitiba, outros quatro processos tramitam na 10ª Vara Federal de Brasília. Na Operação Zelotes, o ex-presidente responde a dois processos: em um, é acusado de tráfico de influência
e corrupção nas negociações que levaram à compra de 36 caças suecos
modelo Gripen pelo Governo brasileiro. Em outro, responde por
supostamente ter recebido vantagens indevidas para favorecer montadoras
na edição da medida provisória 471, de novembro de 2009.
Na Operação Janus,
o petista é acusado de tráfico de influência. Segundo denúncia do
Ministério Público Federal, Lula teria atuado junto ao Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para favorecer a Odebrecht
na obtenção de empréstimos para a realização de obras em Angola.
Na OperaçãoLava Jato, além dos dois processos nas mãos de Moro, Lula responde por supostamente ter tentado comprar
o silêncio do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró. A denúncia tem
origem na prisão do senador cassado Delcídio Amaral (ex-PT-MS).
Se
condenado, a conta que o petista terá de fazer é somar todas as penas
e, deste total, calcular um sexto. Deste um sexto, subtrai-se o tempo
que ele já cumpriu preso. Até agora, sete dias.
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