Novos diálogos revelados entre procuradores da Operação Lava Jato indicam que o partido Rede Sustentabilidade foi usado para propor uma ação no Supremo Tribunal Federal para impedir que o ministro Gilmar Mendes
libertasse presos em processos nos quais ele não fosse o juiz. As
conversas foram publicadas nesta quarta-feira, 7, pelo portal Uol em
parceria com o site The Intercept Brasil.
Segundo a reportagem, o procurador Deltan Dallagnol,
coordenador da força-tarefa, articulou com o senador Randolfe Rodrigues
a apresentação de uma Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF). “Randolfe: super topou. Ia passar pra Daniel,
assessor jurídico, já ir minutando. Falará hoje com 2 porta-vozes da
Rede para encaminhamento, que não depende so dele”, escreveu o
procurador no dia 9 de outubro de 2018. Dois dias depois, a ação foi
apresentada pela legenda.
A legislação prevê que, no âmbito do
Ministério Público Federal, somente a Procuradoria-Geral da República,
comandada por Raquel Dodge, pode atuar perante o STF. Dallagnol, assim
como seus colegas em Curitiba, é procurador da República, primeiro
estágio da carreira e sua atuação está limitada à primeira instância.
Além
da PGR também podem apresentar este tipo de ação no Supremo o
presidente da República, as mesas diretoras da Câmara e do Senado ou de
assembleias legislativas, governadores de estado, o Conselho Federal da
Ordem dos Advogados do Brasil e partidos políticos com representação no
Congresso. Segundo mostra a reportagem, a Rede serviu para Deltan
driblar sua limitação funcional.
Os procuradores da Lava Jato se
queixavam da decisão de Gilmar Mendes em soltar o ex-governador do
Paraná Beto Richa (PSDB), preso em uma operação do Ministério Público
estadual. Dallagnol escreveu a seus colegas que o ministro
“provavelmente” iria expandir a decisão para a Operação Piloto, 53ª fase
da Lava Jato, que também teve o tucano como alvo — embora sem ligação
com as investigações do MP local.
Ao ser informado de que a
relatora da ADPF proposta pela Rede seria a ministra Cármen Lúcia, o
procurador Athayde Ribeiro Costa a chamou de “frouxa”. “Sei nao hein.
Contra gm [Gilmar Mendes]. Ela vai crescer”, rebateu seu colega Diogo
Castor de Mattos. Athayde discorda e a chamou de “amiguinha”. Dallagnol
afirma que “Ela é amiga da esposa do GM”. Em novembro de 2018, a
ministra arquivou a ação.
Outro lado
Por meio de nota, a
força-tarefa da Lava Jato em Curitiba afirmou não reconhecer as
mensagens, ressaltou o fato de elas terem sido obtidas a partir de crime
cibernético e que elas teriam sido editadas ou usadas fora de contexto
para embasar “acusações e distorções que não correspondem à
realidade”. “Tratando do tema em abstrato, é plenamente lícito o contato
com entidades da sociedade civil, públicas e privadas, inclusive o
fornecimento de informações públicas e análises, para defender o
interesse social nos temas de atuação do Ministério Público”, afirmou.
Em
nota conjunta, Randolfe Rodrigues e a Rede negaram que o partido tenha
sido usado pelos procuradores para propor uma ação no STF e que seus
parlamentares “jamais se converteram ou se converterão em meros porta-vozes de quem quer que seja“.
“A ação citada foi ajuizada após o Ministro Gilmar Mendes ter concedido
habeas corpus de ofício a Beto Richa e outros ‘ilustres’ investigados,
burlando as regras de sorteio de relatoria do STF e se convertendo numa
espécie de ‘Liberador-Geral da República’. Repudiamos essa decisão, que
causou enorme embaraço ao Tribunal, por convicção de que ela reflete uma
postura de leniência com corruptos poderosos e não um compromisso
autêntico com o devido processo legal: o ajuizamento da ADPF nº 545 se deu exclusivamente por este motivo.”
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