Folha de .Paulo – Reynaldo Turollo JR
A ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) divulgou
nesta quinta-feira (24) uma carta aberta direcionada aos ministros do
STF (Supremo Tribunal Federal) em que pede providências em relação à
atuação do ministro Gilmar Mendes, que, para a entidade, coloca em
dúvida a credibilidade do tribunal.
A ANPR representa cerca de 1.300 procuradores da República em todo o país.
“Não é de hoje que causa perplexidade ao país a desenvoltura com que o
ministro Gilmar Mendes se envolve no debate público, dos mais diversos
temas, fora dos autos, fugindo, assim, do papel e do cuidado que se
espera de um juiz, ainda que da Corte Suprema. Salta aos olhos que, em
grau e assertividade, e em quantidade de comentários, sua excelência se
destaca e destoa por completo do comportamento público de qualquer de
seus pares”, diz a carta.
O texto menciona a atuação de Mendes no processo que envolve o
empresário Jacob Barata Filho, conhecido no Rio como “rei do ônibus”.
No dia 17, Mendes concedeu habeas corpus a Barata Filho. Pouco depois, o juiz federal Marcelo Bretas determinou novamente a prisão preventiva do empresário. Na sexta (18), o ministro do STF deu nova decisão e soltou Barata Filho.
Mendes foi padrinho de casamento de uma filha do empresário que, em
2013, se casou com um sobrinho da mulher do ministro do Supremo.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a suspeição de Mendes no caso, apontando também a relação de sociedade entre Barata Filho e o cunhado do ministro.
A Procuradoria sustentou ainda que a mulher de Mendes, Guiomar
Mendes, trabalha no escritório de advocacia de Sergio Bermudes, ligado a
alguns dos investigados nesse caso.
Janot pediu à ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, que os atos
de Mendes sejam considerados nulos e que o ministro seja ouvido para
esclarecer os fatos. A carta da ANPR endossa o pedido.
“O ministro Gilmar Mendes não só se dirigiu de forma desrespeitosa ao
juiz federal que atua no caso [Bretas], afirmando que, ‘em geral, é o
cachorro que abana o rabo’, como lançou injustas ofensas aos
procuradores da República que oficiam na Lava Jato do Rio de Janeiro, a
eles se referindo como ‘trêfegos e barulhentos'”, diz a carta.
Para a associação, declarações como essas “trazem desde logo um grave
desgaste ao STF e à Justiça brasileira. Nestas críticas parece ter
esquecido o ministro o dever de imparcialidade”.
“Viola a aparência de imparcialidade da Suprema Corte brasileira a
postura do ministro que, de um lado, e no mesmo processo, lança ofensas e
sombras sobre agentes públicos, inclusive seus colegas, ataca decisões
judiciais de que discorda, e finda por julgar pai de apadrinhado e sócio
de cunhado”, afirma a ANPR.
“Apenas o Supremo pode corrigir o Supremo, e apenas a corte pode –e
deve, permitam-nos dizer– conter ação e comportamento de ministro seu
que põe em risco a imparcialidade […] A ação do Supremo no caso é
essencial para que a imagem e a credibilidade de todo o sistema
judiciário brasileiro não saiam indelevelmente abalados. A eventual
inação, infelizmente, funcionará como omissão”, conclui a
carta. Procurados por meio da assessoria do STF, a instituição e o
gabinete de Mendes não se manifestaram até a publicação deste texto.
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